Na última semana, um dos grandes expoentes da dramaturgia brasileira, Plínio Marcos (1935 – 1999), completaria 86 anos. O autor marcou a história do teatro com sua intrínseca irreverência e transpôs de forma crítica e com excelência o universo ao seu redor.
Apesar de ter tido pouca educação formal, ele criou grandes clássicos do teatro brasileiro. Para constituição da temática de suas peças, Plínio utilizou muito suas vivências pessoais e notícias jornalísticas. Já para o repertório formal dos textos, aproveitou os paradigmas que acumulou durante seus trabalhos no mundo circense.
Foi interpretando o palhaço Frajola no circo-teatro em Santos (sua cidade natal), que o dramaturgo iniciou no universo da arte. Em 1958, participou de um grupo de teatro amador mantido por Patrícia Galvão, a Pagu, a qual apoiou muito sua obra; foi nessa época que Plínio conheceu autores ilustres da história da dramaturgia como Samuel Beckett e Fernando Arrabal.
Em 1959, sua primeira peça foi encenada, Barrela, a qual ele próprio dirigiu. Ela foi inspirada em uma notícia sobre um garoto que, preso injustamente, é violentado na cadeia, mas ao ser liberto volta para se vingar matando alguns de seus companheiros de cela. Segundo Plínio, até este momento ele não tinha pretensão de ser um dramaturgo propriamente dito: o choque que levou da leitura da notícia foi o que lhe impulsionou a escrita do texto.
Em 1960, morou na capital de SP onde trabalhou inicialmente como camelô, e depois como vendedor de álbuns de figurinhas até se tornar técnico na TV Tupi.
Centenário Paulo Freire: Educação como prática da liberdade, por Ueliton Alves
Sua estreia profissional foi marcada pelo lançamento do texto Dois Perdidos Numa Noite Suja, sob a direção de Benjamin Cattan e Ademir Rocha. Sendo uma das peças mais famosas do autor, ela foi inspirada no conto O Terror de Roma do escritor italiano Alberto Moravia. Nela acompanhamos o cotidiano de Paco e Tonho, os dois dividem um quarto numa hospedaria barata à noite e, durante o dia, trabalham como carregadores no mercado. Eles mantêm uma relação conflituosa, com certa frequência entram em discussões sobre suas vidas e perspectivas. Um tema que se sobressai na peça e é recorrente na obra do autor é a marginalidade.
Por dar voz à periferia e retratar a dureza da realidade nas margens da sociedade, seus textos têm um forte tom de crítica. Por conta disso, Plínio enfrentou uma série de problemas com a ditadura ao longo de sua carreira; o autor sofreu inúmeras censuras e chegou a declarar a si próprio como um ”autor maldito”.
Por exemplo, seu segundo grande sucesso Navalha na Carne foi inicialmente proibido, mas contou com a mobilização de ilustres figuras da classe teatral como Cacilda Becker e Walmor Chagas, sendo liberada para estreia em 1967. Neste mesmo ano ainda são montadas suas peças; Quando as Máquinas Param, no Teatro de Arte, sala pequena do TBC, e Homens de Papel, com Maria Della Costa interpretando a catadora de papel Nhanha, pelo Teatro Popular de Arte – TPA.
Em 1968, algumas de suas peças também geram polêmica como: Jornada de um Imbecil até o Entendimento, encenada por João das Neves do Grupo Opinião; e Abajur Lilás, dirigida por Antônio Abujamra, a qual inclusive também foi proibida.
A partir de 1979 há uma mudança em sua carreira, o dramaturgo desenvolveu um interesse por assuntos esotéricos e pela leitura do Tarô, o que culminou na escrita de uma peça “mais tranquila” do ponto de vista político chamada Sob o Signo da Discoteque. Ainda nessa sua ‘segunda fase’, como classificam os críticos, são produzidas Madame Blavatsky (1985), dirigida por Jorge Takla, e Balada de um Palhaço (1986), com direção de Odavlas Petti.
Além disso, o autor também escreveu ainda uma série de peças infantis como As aventuras do coelho Gabriel (1965), História dos bichos brasileiros: o coelho e a onça ou Onça que espirra não come carne (1988) e Assembleia dos ratos (1989).
Plínio Marcos foi uma figura de resistência frente a ditadura e que deixou um legado importante e memorável para a história da dramaturgia brasileira.
Por Leticia Pollizeli, com orientação de Luiza Camargo