JONAS LÍRIO
O texto que você lê foi escrito por alguém. É fácil levar os olhos até a assinatura ali em cima e dar um nome a esta pessoa que você provavelmente nunca viu. Mas o que a motiva? O que a levou a escrever? E o que seu trabalho acrescenta à sociedade? A si mesmo?
Escritores, jornalistas, roteiristas, dramaturgos. Todos, sem exceção, escrevem para alguém – nem que esse alguém esteja só no imaginário do autor. Quando Camila Damasceno entrou para a faculdade de Jornalismo na Universidade Federal de Juiz de Fora, em 2003, ela queria escrever e ponto. Demorou, mas só depois de formada ela entendeu que o que queria escrever não caberia no jornalismo e que o público para quem ela escrevia não necessariamente eram os leitores de suas notícias.
“Quando saí do meu emprego de bancária em São Paulo, que já não tinha nada a ver com jornalismo, caí num limbo, não sabia para onde ir. Aí, vi um cartaz sobre o Processo Seletivo da SP Escola de Teatro no metrô e decidi me inscrever para o curso de Dramaturgia, mesmo sem nenhum contato com teatro além de peças no colégio”, conta. Camila estudou na Instituição de 2011 até 2013. “Meu período lá foi muito marcante, me encontrei tanto no teatro quanto na dramaturgia.”
Escrever foi o que Camila Damasceno fez. Já no primeiro ano, ganhou na categoria Destaque do Festival de Cenas Curtas de Juiz de Fora de 2012; e no ano seguinte, teve um texto de sua autoria lido no concurso cultural Dramaturgias Urgentes, promovido pelo Centro Cultural Banco do Brasil (CCBB-SP). Ela também se tornou orientadora no SP Dramaturgias, projeto da SP Escola de Teatro que reúne interessados no processo do fazer dramatúrgico.
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Recentemente, Camila esteve de volta à Instituição, desta vez para apresentar a peça “Quarenta e Duas”, espetáculo que ficou em cartaz na sede Roosevelt até 23 de abril. O texto – primeira obra que Camila considerou completamente pronta para o palco – foi desenvolvido pela autora durante seus dois anos de formação, mas só montado cinco anos depois pela Cia Artehúmus e o Núcleo Tumulto.
Na peça sobre sensacionalismo e falsas notícias, ela olha para questões relacionadas à sociedade, tema que pauta seu trabalho dentro e fora do teatro – atualmente, cursa o doutorado de Artes da Cena na Universidade de Campinas (Unicamp), desenvolvendo uma pesquisa sobre a ação do dramaturgo-performer na reinvenção da esfera pública.
“Quero escrever sobre o que é ser dramaturga, sobre o que implica trabalhar com teatro. Como um trabalho artístico abre discussões?”, pergunta a artista. São questionamentos de alguém interessado no mundo ao seu redor, característica que Camila vê em comum na dramaturgia e no jornalismo. “Nós, artistas, temos uma função no mundo. Arte não é só entretenimento. Quando se escolhe ser um artista no Brasil, implicam-se uma série de responsabilidades éticas. Saber em que espaço estamos circulando quando a gente faz essa escolha é um tema que me interessa”.
Diferentes visões e convicções políticas também pautam o que a dramaturga escreve com outros aprendizes egressos da SP Escola de Teatro, no Núcleo Tumulto! de Investigação Cênica, criado por eles em 2013. “Cachorro Urubu”, primeiro espetáculo do coletivo, aborda a justiça feita com as próprias mãos. Agora, os artistas desenvolvem “Pepe, o Hipopótamo”, sobre o tráfico e a guerra às drogas. Ela também prepara “Subsolos”, sua primeira assistência de direção, com um grupo formado na graduação da Unicamp – com estreia prevista para outubro, no Festival Internacional de Teatro de Manizales, na Colômbia.
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Na seção Aprendiz em Foco, você confere histórias de quem já passou ou ainda está na SP Escola de Teatro.