O diretor e dramaturgo Anderson Claudir, estudante egresso da SP Escola de Teatro, conquistou o renomado prêmio APCA de melhor espetáculo de 2020 pelo musical Bertoleza.
A direção, adaptação do texto, montagem e as músicas são do artista, que desenvolveu a dramaturgia inspirado no livro O Cortiço, de Aluísio de Azevedo. Entretanto, desta vez a história é sob a óptica de Bertoleza, mulher negra que trabalha incansavelmente para construir e lutar pelo patrimônio que conquistou com João Romão, o protagonista original.
O elenco é todo da Gargarejo Cia Teatral, e a produção foi um sucesso de público e crítica, principalmente pela habilidade de Anderson em conseguir adaptar uma história do século XIX que fosse atual e abraçasse também a luta de outras mulheres negras que foram injustiçadas e violentadas ao longo da dolorosa história do Brasil.
Em entrevista à SP Escola de Teatro, o artista relembrou os anos em que estudou direção na escola, os melhores ensinamentos, lembranças e parceiros e contou como foi o processo de desenvolvimento do espetáculo, que lhe abriu ainda mais portas em sua carreira de sucesso ascendente.
A direção, adaptação e texto final de Bertoleza são seus. É muito trabalho e responsabilidade. Como você conseguiu administrar todas essas funções? Qual foi a atribuição que você mais gostou e a mais difícil?
Anderson: Sempre gosto mais de dirigir. Tridimensionalizar um texto é uma experiência sempre muito gratificante. Já a escrita para mim é um processo muito difícil e complicado. Por sorte, encontrei Le Tícia Conde que me ajudou a criar no texto final e chegar no resultado que é Bertoleza. Escrever junto, para mim, é sempre mais fácil – e a Le Tícia é de uma genialidade e de um lirismo que o texto necessitava.
Como a sua formação pela SP Escola de Teatro em direção te ajudou a montar um espetáculo tão bom que ganhou esse prestigiado prêmio?
A: A SPET foi meu local de maior amadurecimento profissional e de maior desafio como pessoa. Foi ela que me instrumentalizou para que eu pudesse executar esse projeto. Foi a partir dos experimentos, discussões e oficinas que eu comecei a enxergar Bertoleza como um todo. Além de ter sido na escola que encontrei parceiros para vida, como a responsável pelo cenário e figurino, Daniela Oliveira, e nosso diretor musical, Eric Jorge. Além de muitos outros que são do grupo, formados ou alunos deste espaço. A SPET, sem dúvida, foi um divisor de águas para o meu trabalho.
Em seu tempo na SP, qual lembrança, oficina, aula ou ensinamento que você acredita que mais o ajudou em seu trabalho como diretor?
A: A gente vive muita coisa dentro da escola e é difícil lembrar somente uma. São dois anos que parecem dez. Você poder ser questionado, ensinado e desafiado por profissionais como Marici Salomão, Rodolfo Garcia Vázquez, J. C. Serroni e tantos outros que são importantes para a cena teatral, e que já vem de uma experiência acumulada muito grande. Esse fator contribui muito para você entender que tipo de profissional você deseja ser. Acho que é isso: o contato com as pessoas e a troca com elas foi o que mais me ajudou neste trabalho como diretor.
Com Bertoleza, você apresenta a história de uma mulher negra inspirada em um personagem da literatura clássica brasileira, mas também usa esse gancho para falar de outras mulheres negras que foram silenciadas. Agora com mais esse reconhecimento da crítica, você acredita que essa importante mensagem conseguirá atingir outros públicos, chegar a mais pessoas? Quais são seus planos futuros para esse espetáculo?
A: A gente passou por algo muito louco porque a gente estreou em fevereiro de 2020 e logo no fim da temporada entramos em quarentena. Então estamos ansiosos e achamos urgente poder levar esse discurso para mais lugares. Acreditamos que Bertoleza e essas outras mulheres precisam ser ouvidas e vistas, afinal de contas, são elas as bases para que nosso país fosse construído. Poder criar poesia e teatro a partir da vida dessas mulheres é um presente e nós queremos levar esse presente para todos os lugares que pudermos. Além da ansiedade pelo término da quarentena e do encontro presencial, o grupo pretende fazer uma versão específica para ser apresentada virtualmente. Esse é o nosso principal desafio deste momento: transformar uma peça de teatro em um produto que flerte com o audiovisual – e esperamos que até abril possamos fazer essa temporada online.
As canções do musical foram criadas por você. Como foi esse processo de criação? E suas referências?
A: Escrever música é um processo muito natural para mim. Durante o processo de adaptação da peça, várias canções foram” me chegando” e eu fiz uma pesquisa extensa a partir dos ritmos oriundos do século XIX e começo do séc. XX. Foram essas referências que me deram o aporte para compor as canções.
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Por Luiza Camargo