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Da infância ao teatro, o papel dos jogos no estímulo do faz de conta

Estudantes dos cursos regulares durante experimento cênico, na SP Escola de Teatro. Foto: Divulgação/SP Escola de Teatro

POR JONAS LÍRIO

Brincar de cozinhar ou ter um amigo imaginário são coisas comuns às crianças, e, apesar de parecerem simples, estão fundamentalmente ligadas à formação do ser humano. Em seus estudos sobre a evolução do pensamento do recém-nascido ao adolescente, o psicólogo suíço Jean Piaget mostrou que por volta dos 2 anos de idade desenvolvemos, principalmente por meio do faz de conta, a capacidade de criar e representar – características que nos diferenciam dos animais irracionais, por exemplo.

Sem a função simbólica, como essa capacidade é chamada pela Psicologia, o convívio e as relações sociais não teriam como existir, assim como o Teatro e as outras artes também não – afinal, jamais teríamos como contar uma história sem conseguir compreendê-las. É por isso que estimular o faz de conta desde muito cedo é uma preocupação de educadores e psicólogos.

“A nossa capacidade de elaboração de metáforas, de dar sentido às experiências, tem sido trabalhada cada vez menos. Estudos afirmam que a gênese do Teatro e a nossa relação com a arte estão na função simbólica, na nossa capacidade de produção de símbolos, de dar significado ao mundo a partir das nossas experiências”, explica o coordenador pedagógico da SP Escola de Teatro, Joaquim Gama. “E tudo isso é desenvolvido a partir da função simbólica”.

>> ‘A fisicalização no sistema de jogos teatrais’, por Joaquim Gama

Neste semestre de 2019, essa capacidade está no centro do tema que vai nortear as discussões e os trabalhos dos cursos regulares da Instituição. A ideia é mergulhar no universo da infância e experimentar, a partir dos jogos teatrais, procedimentos que não só parecem, mas realmente são brincadeira de criança – e estão intrinsecamente ligados à função simbólica.

“As brincadeiras que fazemos quando pequenos nada mais são do que maneiras de dar sentido ao mundo”, conta Gama. Segundo ele, o tema veio naturalmente após o último semestre de 2018, em que se discutiu preconceito etário. “Como o envelhecimento, o universo da infância também está presente em todos nós, porque já fomos criança um dia”.

OS JOGOS NAS ARTES

Foi a partir de brincadeiras de criança que a diretora de teatro e pedagoga norte-americana Viola Spolin sistematizou os jogos teatrais. “Assim como aprendemos a calcular para estudar matemática, que nada mais é do que uma linguagem, os jogos teatrais facilitam a apreensão da linguagem teatral”, explica a professora da USP Ingrid Koudela. Principal estudiosa no Brasil do trabalho Viola e autora de vários livros sobre o tema, como “Texto e Jogo” (1999) e “Jogos Teatrais” (2006), Koudela será operadora do semestre da SP Escola de Teatro, teórica cujos textos serão usados para embasamento das pesquisas desenvolvidas pelos estudantes nos experimentos cênicos.

Em Chicago, entre as décadas de 1930 e 1940, Viola Spolin trabalhou em uma escola do governo que recebia famílias de imigrantes, principalmente italianos, judeus, russos, mexicanos e irlandeses. Responsável pela integração dessas pessoas, ela utilizava as brincadeiras tradicionais dos países daquelas famílias para estimulá-las ao convívio social e a uma melhor adaptação ao novo lar.

Foi observando essas brincadeiras que Viola se apoiou para definir uma das principais características da metodologia dos jogos teatrais: o valor da experiência em grupo. “O objetivo dos jogos é o próprio ato de jogá-los, já que vem daí a relação com o outro”, explica Ingrid. Segundo a pesquisadora, é por meio desse contato com o mundo que a criança passa a desenvolver várias de suas capacidades mentais, entre elas a de compreensão da realidade através de histórias e metáforas.

Apoiada nessa teoria, a coordenação pedagógica da SP Escola de Teatro escolheu a literatura infantil como campo de exploração dos trabalhos do semestre. “Os livros mostram o modo como as crianças veem o mundo”, justifica Joaquim Gama. O que não significa, porém, que a pesquisa a ser desenvolvida no período será voltada ao teatro infantil, ressalta o coordenador. “Os textos vão servir de base para a construção dramatúrgica dos trabalhos e para a questão dos jogos, para que tudo isso se transforme em cena. A ideia é trabalhar com o universo imaginativo que faz parte da infância.”

Ao longo do semestre, os estudantes da Escola vão se apoiar nos trabalhos de Viola Spolin, Ingrid Koudela e de grupos que levam os jogos teatrais ao palco para criarem experimentos cênicos inspirados no imaginário da infância. “A ideia é não utilizar os jogos somente durante os processos de preparação, mas levá-los à cena de fato”, afirma o coordenador pedagógico da Instituição. Segundo Gama, o objetivo é estimular “um teatro vivo, que envolva a plateia nas criações”.

Coordenadores dos cursos regulares conversam com estudantes no encontro Panorama das Artes do Palco. Foto: Bruno Galvincio

Coordenadores dos cursos regulares conversam com estudantes no encontro Panorama das Artes do Palco. Foto: Bruno Galvincio

PANORAMA

Nesta terça-feira (5), os coordenadores dos oito cursos regulares e a pesquisadora Ingrid Koudela iniciaram o Panorama das Artes do Palco, no qual discutem com os estudantes as perspectivas e direcionamentos do trabalho pedagógico a serem desenvolvidos neste semestre. O primeiro dia de encontro é voltado ao estudantes do módulo azul. Na quarta-feira (6), o trabalho é voltado aos estudantes do módulo verde.




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