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Três dias para refletir sobre o teatro comunitário ao redor do mundo

Cheguei ontem de Portugal, ainda com as imagens e emoções vívidas da minha participação no I Encontro Rede Internacional de Teatro Comunidade e Artes Participativas, realizado entre os dias 2 e 4 de outubro, na charmosa cidade de Funchal, na Ilha da Madeira.

Foi uma viagem breve, mas cheia de encantos. Assim tem sido sempre que retorno a Portugal, minha segunda casa.

Até então, não conhecia Funchal, e nunca tinha saído do continente. A cidade me cativou não só por suas paisagens deslumbrantes e clima ameno, mas também pela hospitalidade calorosa de seus habitantes, que tornaram cada momento da estadia ainda mais acolhedor e especial.

O encontro destacou-se por uma atmosfera de intensa reflexão coletiva e interdisciplinar, em que os participantes puderam explorar, em conjunto, os diversos terrenos de investigação que interligam a atividade cultural, a criação artística, as ciências sociais e as políticas públicas. Foi uma verdadeira celebração da capacidade transformadora da arte e do teatro nas comunidades, reafirmando a importância de iniciativas culturais que dialogam profundamente com o contexto social em que se inserem.

Já no primeiro dia do evento, apresentei meu seminário “Educação, Teatro e Ecologia”, evocando questões artísticas, pedagógicas e sociais que atravessam o modelo sistêmico de organização e ensino adotado na SP Escola de Teatro, projeto mantido pela Secretaria da Cultura, Economia e Indústria Criativas do Estado de São Paulo. A partir uma concepção ampla de ecologia, compreendida como universo de interações de qualquer organismo com o ambiente em que vive, expliquei como buscamos criar, em nossas ações, territórios econômicos, culturais e simbólicos que valorizem os aspectos relacionais do binômio indivíduo-sociedade.

Entre os muitos outros projetos apresentados, um que merece destaque é o da Associação Olho-te, que atua no bairro de Nazaré, em Funchal. Essa iniciativa trouxe nova vida à comunidade por meio de um trabalho de vivificação impulsionado pela arte. Conduzido pelo ator e diretor Hugo Andrade, o projeto ressignificou o espaço urbano e fortaleceu os laços comunitários, promovendo uma transformação visível e poderosa.

Outro projeto que me impressionou foi o da Associação Beleza Teatro, de Rio Maior, em Portugal. Sob a direção do encenador Rui Germano, a iniciativa “Somos Todos um Rio” trouxe à cena a força da coletividade e a fluidez das relações humanas, utilizando o teatro como uma ferramenta expressiva das conexões e interdependências que nos unem.

Emocionante também foi o trabalho de Edith Scher, diretora do coletivo Matemurga Teatro Comunitário de Vila Crespo, na Argentina, que apresentou uma abordagem engajada e popular do teatro comunitário.

Igualmente fascinante foi conhecer mais de perto o trabalho do Teatro Umano, de Lisboa, liderado por Rita Wengorovius, que explora questões de identidade e pertencimento com uma sensibilidade poética singular.

As contribuições internacionais enriqueceram ainda mais o evento. Domingo Adame, da Universidade Veracruzana, no México, trouxe uma lucidez impressionante em suas reflexões sobre teatro e comunidade, enquanto Beatriz Wey, da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro, transportou alegria e esperança ao compartilhar suas experiências e visões sobre a construção de futuros mais inclusivos e participativos.

Outro destaque foi o trabalho notável da doutora Isabel Bezelga, especialista em teatro, educação e comunidade, e diretora do curso de Licenciatura em Teatro da Escola Superior de Teatro e Cinema, de Évora, Portugal. Isabel apresentou os resultados de seu trabalho desenvolvido nos últimos anos, oferecendo uma rica visão sobre suas práticas e investigações.

Por último, mas não menos importante, conhecemos o trabalho de José Eduardo Silva, também da Universidade do Minho. O seu projeto “Irromper”, que aborda o teatro e a saúde mental, foi um dos pontos altos do encontro, trazendo uma abordagem sensível e profunda sobre os contextos e percursos dessa relação.

O evento também abriu espaço para conhecer novas pessoas e rever amigos queridos. Entre eles, Tito Lívio, importante crítico da cena portuguesa, que conheceu nosso trabalho no Satyros lá nos anos 1990.

Durante o encontro, Tito atuou como mediador de algumas sessões e, com sua habitual sensibilidade poética, ofereceu leituras de seus próprios poemas, o que foi um prazer imenso de presenciar.

Esses três dias em Funchal foram uma experiência enriquecedora, que não só reafirmaram a importância da arte e do teatro no desenvolvimento comunitário, como também trouxeram novas perspectivas sobre como esses campos podem dialogar com questões sociais urgentes em diversas partes do mundo.

Ivam Cabral é diretor-executivo da SP Escola de Teatro e um dos fundadores da Companhia Os Satyros




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