A companhia teatral Carcaça de Poéticas Negras nasceu em 2016, quando um grupo de estudantes da Escola Livre de Teatro de Santo André e da Escola de Arte Dramática da USP decidiu se juntar para pesquisar teatro à luz de suas vivências como jovens negros periféricos e LGBTQIA+.
Nesse contexto, Piu Guedes e Tricka Carvalho buscam, por meio da atividade teatral, investigar a linguagem do corpo negro urbano e suas diásporas, o genocídio e o etnocentrismo na atualidade. Nesse sentido, o grupo explica que uma das funções de seu trabalho é a de dialogar mais sobre a ‘carcaça’ de símbolos da ancestralidade negra que revela camadas de uma história apaga e sem alforria.
Em 2017 e 2018, o segundo espetáculo do grupo, chamado Buraquinhos ou o Vento É Inimigo do Picumã, recebeu muitos prêmios, entre eles o da IV Mostra de Dramaturgia em Pequenos Formatos Cênicos do Centro Cultural de São Paulo, o APCA e o Aplauso Brasil.
As linguagens que influenciam a maioria dos trabalhos da companhia são as estéticas de periferia, como por exemplo, o funk, rap e o slam. Tendo isso em vista, o Carcaça visa articular tais formas de expressão, ascendentes na contemporaneidade, com pautas da cultura LGBTQIA+ e de tradições de matriz africana. Nessa conjuntura, a Cia comenta a importância de ações artísticas que discutam tais temáticas:
“O objetivo principal é oferecer representatividade para quem nos assiste e, sobretudo, contribuir para que tal reflexão se amplie e ganhe força na negritude”.
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Sobre o processo criativo, o grupo explica que a dramaturgia se desenvolve a partir do conceito ‘sankofa’, palavra que, traduzida do Akan, significa ‘volte e pegue’ e é representada pela imagem de um pássaro com a cabeça virada para trás, pegando um ovo em suas costas. Em seu relato, o coletivo explica o significado de tal símbolo, que representa a importância de voltar ao passado para entender o presente:
“Esta é uma verdadeira encruzilhada entre o passado e o futuro: para nós é a possibilidade de construir um amanhã próspero”.
Nesse cenário, seu primeiro espetáculo foi montado a partir de estudos sobre o Teatro Experimental do Negro de Abdias Nascimento e Ruth de Souza. Assim, o grupo comenta a centralidade da ancestralidade para concepção de seus trabalhos:
“O Carcaça percorre o caminho do próprio corpo, dos familiares, dos seus ancestrais, das comunidades, dos mestres e dos livros. ”
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Para a Cia, o teatro tem muitas funções no mundo atual, e essas variam de acordo com o grupo e indivíduo que se propõe a fazer o espetáculo, pois as trajetórias são múltiplas e bem diferentes umas das outras. No entanto, o Carcaça de Poéticas Negras faz um recorte quanto à sua maneira de enxergar a arte teatral:
“Para os gregos, o teatro é o lugar ‘de onde se vê’, para nossa pesquisa enquanto Coletivo é a possibilidade de representar, discutir e devolver para a sociedade histórias que foram apagadas ressignificando e usando como ferramenta uma arte hegemônica/branca. É sobre representatividade, sobre resgaste identitário, sobre ocupação e construção de novos imaginários”.
Mais infos sobre a Cia. Carcaça de Poéticas Negras estão no livro Teatro de Grupo, uma publicação do Selo Lucias, braço editorial da ADAAP, associação que gere o projeto da SP Escola de Teatro.