SP Escola de Teatro

Selo Lucias convida coletivos teatrais do Brasil para participação em livro histórico

Experimento II do grupo N3 Vermelho, do segundo semestre de 2024, na SP Escola de Teatro. | Foto: Clara Silva/Adaap

O projeto Mapeamento do Teatro de Grupo nas Capitais Brasileiras é uma iniciativa de Ivam Cabral, diretor executivo da SP Escola de Teatro – Centro de Formação das Artes do Palco, Elen Londero, Marcio Aquiles e Alexandre Mate, com intuito de catalogar e apresentar os processos criativos das companhias do país.

Ao lado de artistas e acadêmicos de todas as regiões, esse núcleo de pesquisadores está empreendendo, desde janeiro de 2024, o mapeamento do sujeito histórico do teatro de grupo nas capitais. As ações do projeto estão pautadas na memória, diversidade e modos de produção do teatro produzido no Brasil, de modo a revelar a riqueza cultural cênica que movimenta a indústria criativa de seus respectivos territórios, além evidenciar como esse campo gera um capital simbólico poderoso para a cultura brasileira como um todo.

Trata-se de uma pesquisa inédita sobre as referências estéticas, os processos criativos e o histórico dos coletivos em epígrafe, sob o ponto de vista de uma extensa catalogação documental, afetiva, descritiva e analítica.

O projeto será o terceiro volume de uma série, iniciada com “Teatro de Grupo na cidade de São Paulo e na grande São Paulo: criações coletivas, sentidos e manifestações em processo de lutas e de travessias (2020), livro que compilou a produção de 194 coletivos e que recebeu, no ano seguinte, o Prêmio Especial APCA.

O segundo volume, Teatro de grupo em tempos de ressignificação: Criações coletivas, sentidos e manifestações cênicas no Estado de São Paulo (2023), por sua vez, catalogou 335 grupos do Estado de SP.

As versões digitais desses e de outros livros podem ser acessadas aqui.

Assim, o selo Lucias convida coletivos teatrais de todas as capitais, incluindo do Distrito Federal e com exceção de SP, pois os grupos já foram mapeados nos livros anteriores a participar do projeto. Todas as explicações e materiais necessários podem ser acessados exclusivamente por meio deste link: https://forms.gle/nqU4T8tScVfZmhWs9. O objetivo do projeto é publicar o terceiro livro da série, que terá, assim como os anteriores, distribuição totalmente gratuita.

Caso você tenha dúvidas sobre se a sua Companhia se encaixa dentro do sujeito histórico teatro, leia o texto abaixo, do professor Alexandre Mate, que apresenta algumas das características mais marcantes que definem esse fenômeno e que caracterizam o escopo dessa obra em produção.

Algumas considerações sobre o sujeito histórico teatro de grupo

No mundo da cultura (o que é bom), há dissonâncias quanto às apreensões e entendimentos de conceitos e práticas, em qualquer área da vida. No sentido de “afinar” os critérios para a seleção do sujeito estético-histórico-social a ser investigado, sobretudo no que concerne às suas práxis, preparou-se um texto sucinto (e passível de discussão futura, evidentemente) que busca coligir informações fundamentais de identificação de tal sujeito.

Agrupamentos para operacionalizar ações necessárias e das mais variadas naturezas têm se formado. Em recorte seco, por exemplo, pode-se afirmar que nas escolas de teatro, conjuntos específicos de estudantes se agrupam para cumprir as tarefas estético-pedagógicas demandadas para sua formação. Normalmente, se se trata de processo de agrupamento sem imposições exteriores, determinadas afinidades promovem as aproximações. Por este viés, e até o espetáculo final, que congrega o conjunto de estudantes da turma, em não havendo afinidades de diversas naturezas, a obra é apresentada por certo agrupamento. Possivelmente, por tal determinação são raros os grupos formados nas escolas de formação (cursos técnicos e universitários) que continuam em atividades.

Grupos, companhias, trupes, coletivos… várias podem ser as designações que batizam as formações de sujeitos artistas que querem se dedicar à linguagem teatral. Entretanto, o que, em tese, caracteriza o sujeito histórico teatro de grupo, além das afinidades estético-ideológicas, e não necessariamente vividas em harmonia, compreende a operacionalização dos procedimentos de pesquisa e de criação em proposições colaborativas; os procedimentos pedagógicos, intrínsecos à práxis de existência, podem ser franqueados, a partir de critérios distintos, a outros sujeitos e grupos de interesse; nos processos de apresentação do espetáculo, cuja partitura é aberta e repleta de lacunas, os dialogismos daí decorrentes podem até ajudar a reconfigurar certos tratamentos de que o coletivo lançou mão para a criação da obra coletiva.

Evidentemente, tais proposições variam de acordo com conjuntos (in)articulados de objetividades e subjetividades, a coligir tempo de existência do coletivo; obras montadas e apresentadas, em locais e comunidades distintas; facilidades de interlocução e desenvolvimento das potencialidades de escuta. Na condição de obra pública, apresentada em espaços distintos, públicos ou privados, em locais abertos ou fechados, as linguagens representacionais, cujos tratamentos e interesses sigam as formas populares de cultura, os procedimentos experimentais ou atentas aos paradigmas das formas hegemônicas, serão sempre – por sua natureza e fundamentos conviviais – obras públicas.

Em tese, a determinação de ser obra pública, criada por meio de expedientes colaborativos (épicos e teatralistas), manifesta essencialmente a condição de existência do sujeito histórico aqui em evidência. Por intermédio de trocas de experiências significativas, que se operacionalizam em todo o processo de existência da obra, as proposições práxicas ocorrem e articulam o histórico, o estético, o pedagógico em convivialidade mais propensa à apreensão das características e contradições da contemporaneidade.

Em perspectiva mais “objetiva”, podem ser verificados no trânsito de criação e existência do sujeito histórico aqui em evidência (suprimindo as determinações históricas mais referenciais), as seguintes proposições:

– aterramento histórico-geográfico em questões significativas postas pela contemporaneidade e naquelas da comunidade na qual o coletivo (tendo ou não uma sede) se insere. Em razão do trânsito com os expedientes do teatro épico, as questões da contemporaneidade (algumas vezes mais urgentes) tendem a caracterizar-se em fundamento no processo de criação.

– o texto dramatúrgico, em qualquer de suas categorias ou possibilidades, caracteriza-se em ponto de partida, mas não de chegada no processo de criação. Nos processos de criação dos sujeitos aqui em destaque, os textos não determinam (textocentrismo) a caminhada a ser seguida. Partindo de um texto pronto (consagrado ou não) ou de outros estímulos (música, poesia, tela, frase, bilhete de loteria, um tema…) a práxis essencial da montagem compreende, sobretudo o ato da ressignificação.

– as obras criadas, em total ou parcial processo colaborativo, tendem a fundamentar-se em princípios do teatro épico, em inventividades características das proposições experimentais e em expedientes das formas das formas populares de cultura.

– as obras criadas decorrem de processos de pesquisa mais intensificados. Em tal perspectiva, coligindo às proposições de trocas, os partilhamentos pedagógicos são fundamentais e tendem a unir artistas e interessados (artistas ou não) no processo como um todo.

– esteticamente, tendo em vista os explicitados anteriormente, as obras se caracterizam pelo uso de procedimentos de teatralidade, explicitando e estimulando determinados jogos de troca fundantes às obras com partituras lacunares. Nessa proposição, os paradigmas e blindagens das formas hegemônicas são evitadas.

– sempre em tese, as obras criadas pelo sujeito histórico aqui em evidência, tende a desenvolver-se por meio de estruturas narrativas episódicas. Nessa perspectiva, os hibridismos e misturas estilísticas são buscadas. Nesse hibridismo, bastante distantes às proposições do drama, não há protagonistas, mas funções protagônicas, a depender da voz e do sujeito (alegórico ou não) em evidência em cada episódio.

– os sujeitos reunidos na formação de um coletivo (ligado ao sujeito aqui evidenciado), evidentemente, têm de sobreviver a partir de seu trabalho, mas suas criações não têm apenas intenções comerciais.

– o chamado teatro de grupo pode ser apresentado por meio de monólogos, também. Primeiramente é preciso considerar que o espetáculo, que não segue as determinações do drama (e se fecha em si mesmo), se caracteriza em fenômeno ou experimento estético-histórico-social que se manifesta na condição de troca. Na condição de um experimento aberto, a obra existe por sua permeabilidade ou estado/ natureza de vacância. Assim, um grupo, em seu processo de criação pode ser representado por apenas uma pessoa, mas depende dos procedimentos e expedientes de que tenha lançado mão para sua existência.

De fato, o assunto é complexo e absolutamente repleto de possibilidades não pensadas. A constituição de um grupo de sujeitos, como a Rede que estamos a criar, caracteriza-se em uma possibilidade dialógica de ampliação e de reconsideração.

O mais “tranquilo” (embora funesto) seria não apresentar os modos de pensar diante das complexidades, mas temos de fazê-lo, temos de tentar nos “colocarmos em risco” e explicitar – quem sabe, também – nosso espaço de vacância.

Chamamento Teatros de Grupo Brasil - SP Escola de Teatro

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