Entre as muitas atrações oferecidas no Território Cultural deste sábado (20/8), um dos momentos mais esperados foi a Mesa de Discussão “O Circo: A Velha Nova Arte”. Promovida pelo setor de Difusão Cultural da SP Escola de Teatro –Centro de Formação das Artes do Palco, esta é a primeira vez que uma Mesa de Discussão integra o evento.
Para explorar o universo do circo, foram convidados quatro profissionais intimamente ligados ao assunto: Hugo Possolo, Marcos Teixeira, Rodrigo Matheus e Val de Carvalho. O primeiro a assumir o microfone foi Marcos Teixeira, que, além de jornalista, é o atual coordenador da Área de Circo da Funarte. Após se apresentar e resumir sua trajetória profissional – assim como os outros convidados fariam a seguir – Teixeira centrou seu discurso na evolução das políticas públicas voltadas ao circo.
“Vou falar de 2003 em diante, porque antes disso nem dá para comentar. O País era totalmente carente desse tipo de ação”, afirmou, antes de enumerar cada uma das iniciativas que são desenvolvidas sob sua coordenação na Funarte. Assim, as ações de fomento à produção, de estruturação da atividades circenses, e de capacitação e valorização da atividade circense foram os temas abordados.
Em geral, todas essas ações buscam solucionar os vários problemas e limitações enfrentados atualmente pelos profissionais de circo no Brasil, como a dificuldade para conseguir uma aposentadoria, a polêmica questão da permissão para utilizar animais nas apresentações, a falta de um mapeamento eficiente para localização de circos – que se torna cada dia mais difícil pela interiorização que vem sofrendo –, e mais uma série de temas que precisam ser discutidos. “O circo é a atividade que menos se beneficia das leis de incentivo à cultura”, garantiu.
O jornalista finalizou com um número que, à primeira vista, surpreende: segundo ele, cerca de R$ 28.107.000,00 foram investidos no circo, entre 2003 e 2011. A despeito da evolução que essa constatação representa, Hugo Possolo, o próximo a receber a palavra, comenta: “o circo é o primo pobre, jogado para o escanteio. 28 milhões não é nada, é uma miséria”.
Por sua formação como palhaço – além de jornalista, ator e diretor de teatro –, Possolo tentou deixar de lado o quesito “política” e focar no aspecto artístico e histórico do circo, dissertando sobre sua função social como transformador da realidade. “Existe algo que é conflituoso na atividade circense: boa parte dela é composta por diversas modalidades. Ela é esporte, pelos números de acrobacia, mas ao mesmo tempo é arte, pois, ao ver aquelas técnicas, as pessoas têm sua realidade transformada, criam um espaço de sonho onde nada é impossível.”
O palhaço, segundo ele, passou a representar uma imagem do circo, seu principal ícone. Seu objetivo é justamente o contrário dos acrobatas: ele brinca com a forma que o homem desafia a natureza. Tropeça, erra os movimentos, demonstra medo, como se ela sempre fosse mais forte, imbatível.
A partir de então, Possolo falou sobre a história do chamado “circo novo”, que ganhou força na década de 80, na França; e, em alguns momentos, adotou um olhar crítico e tom mais grave para comentar a situação do artista circense, que, em sua opinião, “vive um regime quase medieval”.
Marcos Teixeira, Rodrigo Matheus, Val de Carvalho e Hugo Possolo (Foto: Arquivo SP Escola de Teatro)
Também palhaça, atriz e diretora, Val de Carvalho foi a terceira a se apresentar. Uma das pioneiras na inclusão da mulher na arte do palhaço, ela começou dizendo: “a minha maior colaboração para esta discussão é passar um pouco da minha longa vivência dentro do circo”.
Vinda de uma época onde a tradição circense era repassada, principalmente, entre gerações da mesma família, Val falou especialmente sobre o preconceito sofrido pela mulher palhaça e pelos profissionais do circo em geral, que “eram tratados como ladrões, pessoas perigosas”. A Academia Piolin de Artes Circenses (Apac), onde se formou, foi também muito lembrada. Ao contrário de Possolo, a convidada ficou feliz pelos dados trazidos por Teixeira: “Fico contente em ouvir esses números, porque eu vivenciei aqueles tempos antigos e sei como era”.
Chegava a vez de Rodrigo Matheus. Ator, diretor e professor de técnicas circenses e teatrais, fundador do Circo Mínimo, da Central do Circo e do Centro de Formação em Artes Circenses (Cefac), ele destacou a formação de artistas circenses, o sistema pedagógico e as propostas instituídas pelo Cefac. “Nós estabelecemos uma formação regular, com quatro anos de duração, na qual não eram estudadas apenas técnicas circenses, mas elementos de teatro, dança e matérias teóricas.”
Também abordou a relação frouxa entre os circenses que têm suas raízes e moram nos centros urbanos e aqueles que estão ligados à tradição do circo de lona. Para finalizar, falou sobre as inovações presentes no circo hoje, frutos do encontro entre seus profissionais e estudantes de teatro que procuravam uma qualificação em seu ofício a partir de técnicas do circo.
Antes de o encontro terminar, os convidados responderam a algumas perguntas do público, que estava curioso sobre o processo de captação de recursos, as acusações de maus-tratos a animais e a falta de cursos para iniciantes na área.
Texto: Felipe Del