Desde semana passada e durante essa semana, a SP Escola de Teatro recebe uma residência artística internacional, dos renomados artistas Aleksandar Dunđerović (sérvio) e Stephen Simms (britânico), ambos acadêmicos em Birmingham, importante centro teatral do Reino Unido.
Aleksandar Dunđerović, diretor teatral e professor, é doutor em estudos teatrais pelo Royal Holloway, fundador do grupo Theatre Kolectiv e, atualmente, é diretor do Center for Interdisciplinary Performing Arts, da Birmingham City University.
Em 2023, ele publicou pela editora Routledge o livro “Live Digital Theatre: Interdisciplinary Performative Pedagogies”, que traz uma análise do trabalho da Companhia Os Satyros durante a pandemia e seu trabalho com o teatro digital. O livro investiga maneiras de trazer a performance digital ao vivo para o treinamento teatral e a produção de performance.
A capa do livro traz uma imagem da produção “MacBeth”, parceria da Companhia de Teatro Os Satyros e do Royal Birmingham Conservatoire.
Já Stephen Simms é ator e vice-diretor do Royal Birmingham Conservatoire e coordenador de Atuação na instituição. Um dos atores mais respeitados do Reino Unido, Simms trabalhou com a Royal Shakespeare Company e apresentou inúmeras peças ao redor do mundo.
Como parte da residência, em um primeiro momento, Dunđerović e Simms ministraram de 9 a 12 de maio o curso “Buscando o amor em ‘Looking for Andy’: da textualidade à virtualidade”, organizado pela Extensão Cultural, onde exploraram o uso da performatividade e de diferentes pedagogias no teatro digital ao vivo.
Agora, a partir do dia 19, a dupla apresenta no Espaço dos Satyros o espetáculo “Looking For Andy”, trabalho que explora a performance digital e que surgiu de um trabalho colaborativo com artistas brasileiros há um ano, quando começaram encontros e ensaios virtuais.
A peça “Looking For Andy” terá duas apresentações, no Espaço dos Satyros. Na sexta-feira, 19 de maio, acontece às 21h. No sábado, dia 20, acontece às 17h. Os ingressos custam 10 reais e podem ser encontrados presencialmente na bilheteria dos Satyros ou online.
Com concepção de Dunđerović e Simms, o espetáculo tem direção de Dunđerović e atuação de Simms, além de contar no elenco com os artistas convidados Henrique Mello, Sabrina Denobile, Marcia Daylin, Ingrid Oliveira, Alana Carrer e Ícaro Gimenes. Estudantes da Escola também estão trabalhando na iluminação, sonoplastia e outros aspectos técnicos da montagem.
Participam os estudantes Camila Ismerim, Luís Felipe Leão, Edilena Malta, Igor Yabuta e Vinícius Nunes, que estão trabalhando em aspectos de iluminação, som, vídeo e produção de ferramentas digitais.
Outro ponto interessante passa pelo cenário. Para representar o famoso Studio 54, clube icônico de Nova York nos anos 1970, Simms e Dunđerović estão usando uma estrutura inflável que serve de espaço performático e foi criada por Maria Sanchez (Reino Unido) e Antonio Cobo (Espanha). Em 2022, ambos coordenaram um workshop em Madri, na Escuela Técnica Superior de Arquitectura de Madrid, juntos do professor Javier Ruiz Sanchez, onde estudantes de arquitetura ajudaram na construção da imensa estrutura inflável.
Guilherme Dearo, da SP Escola de Teatro, entrevistou Aleksandar Dunđerović e Stephen Simms sobre “Looking For Andy”, a residência no Brasil e questões sobre as performances digitais. Confira:
Como e quando foi o processo de criação de “Looking For Andy”? Por que escolheram Andy Warhol como tema?
Stephen Simms – O projeto começou há um ano. Escolhemos Warhol porque é um personagem com o qual sempre fomos fascinados. Da minha parte, sempre amei a arte dele e sou muito interessado pelo período da Pop Art nos anos 1960 e 1970. O processo de concepção de “Looking for Andy” se vale da vida de Warhol, de seu tempo, de sua arte, mas é para levar a uma reflexão pessoal. É menos explorar Warhol em si e mais explorar as suas próprias conexões com ele, pensar sobre o que, de si, pode refletir nele e ser excitado por ele.
Aleksandar Dunđerović – Não estamos lidando aqui com uma recriação histórica ou documental de Warhol, não é uma peça sobre a vida dele. Estamos falando, sim, de tópicos de sua vida que nos inspiram e nos provocam: obsessão, relação com a perfeição ou as imperfeições de corpos, amor, paixão, relação com a morte e com a vida depois de morte etc. Há muitas maneiras de entrar na vida de Warhol.
E como surgiu a possibilidade de parceria com Os Satyros e a SP Escola de Teatro para fazer essa residência artística?
Aleksandar Dunđerović – Durante a pandemia de Covid, colaborei com Os Satyros e criamos uma produção conjunta, feita de maneira digital via Zoom. Foi uma experiência muito enriquecedora. Depois dessa ação, que está explicada no livro que escrevi “Live Digital Theatre: Interdisciplinary Performative Pedagogies”, pensamos, eu e Simms, em fazer uma performance sobre Warhol. Vamos trabalhar novamente com esse conceito de digital agora, pois a apresentação de sábado terá transmissão via Zoom para o mundo. Estamos muito felizes com essa parceria. Estamos no Royal Birmingham Conservatoire pensando em uma colaboração mais longa entre nós, Os Satyros e a SP Escola de Teatro. Ficamos muito felizes com o alto nível dos participantes do workshop e dos estudantes da escola trabalhando na peça.
Como uma dupla trabalhando em “Looking For Andy”, como foi esse processo colaborativo? Como se deu a divisão do processo criativo, técnico etc.?
Stephen Simms – Eu sempre trabalhei com um texto em mãos, por causa da minha formação de ator clássico na Inglaterra, trabalhando com a Royal Shakespeare Company, por exemplo. Dessa vez, o processo foi totalmente diferente. Não somente trabalhei como ator, mas ajudei na criação do material do zero. Participei da sonoplastia, da iluminação, da criação dos vídeos. Foi um projeto muito mais envolvente. Sobre esse trabalho em dupla, não é incomum que haja isso no teatro, já que se trata, obviamente, de uma arte colaborativa, feita na coletividade. Sasha [Aleksandar Dunđerović] é o diretor que trabalha mais a partir do exterior, ele olha de fora para dentro, enquanto eu sou um diretor mais interno na peça, olhando de dentro para fora, a partir do personagem. São dois lados da mesma moeda.
É a primeira vez que “Looking For Andy” é apresentada? O que o público pode esperar da peça?
Aleksandar Dunđerović – “Looking For Andy” tem sua primeira exibição agora em São Paulo, então é uma estreia mundial. E é, também, um processo ainda aberto, que vai se transformar. Estamos planejando levar a produção para Londres, depois Nova York, onde sofrerá mudanças. Nossa maneira de trabalhar sempre muda, então as duas apresentações de sexta e sábado serão muito diferentes. Muito do que o público responde no momento é usado para transformar a peça. A audiência pode esperar o inesperado. Vamos levá-los de um ponto onde achamos quem Warhol é para um ponto onde entendemos ele por dentro, vemos os seus demônios internos, e abandonados a primeira impressão. Na peça, conhecemos Warhol pelo olhar de outro personagem, que é obcecado pelo artista. Esse homem sai de Nova York para São Paulo e aqui, conhecendo a cidade, começa a olhar para os cantos mais obscuros de Andy.
Professor Dunđerović, no seu livro “Live Digital Theatre: Interdisciplinary Performative Pedagogies”, você explorou o tema da performance digital e falou do trabalho com Os Satyros durante a pandemia. Como a performance digital estará presente na peça?
Aleksandar Dunđerović – Primeiramente, esse trabalho já começou à distância, uma vez que iniciamos os ensaios em plataformas digitais. Agora, na semana anterior à peça, vimos o elenco ao vivo pela primeira vez e retomamos os trabalhos. Agora, fora a transmissão da peça via Zoom, usamos no espetáculo muitas projeções, câmera ao vivo, relação do digital com o espaço e os sons. Então há um diálogo com o digital de maneira integrada ao texto, não somente como suporte tecnológico.