PAI UBU: Quê? Mãe Ubu, não entendi nada do que
você disse.
MÃE UBU: Porque você é burro!
Meu primeiro contato com a obra de Alfred Jarry foi na clássica montagem Ubu, Folias Physicas, Pataphysicas e Musicaes 2, do Grupo Ornitorrinco, em 1996, ano em que a grande maioria do elenco d’Os Geraldos ainda não conhecia os caminhos gozosos do teatro. Ao assistir à estreia de Ubu Rei, resultado do segundo encontro do grupo campinense Os Geraldos com o diretor Gabriel Villela, percebi que era preciso documentar essa explosão de vitalidade, frescor e desbunde estampada em cada um dos integrantes do elenco e construir uma ponte, mesmo que mnemônica, entre os dois espetáculos separados no tempo por quase três décadas.
A obra faz uma sátira do poder obtido por usurpação e exercido com tirania, ao apresentar Pai e Mãe Ubu, um casal entregue à barbárie que invade a Polônia e, assassinando o rei, assume o seu trono. Considerado por dadaístas e surrealistas como precursor desses movimentos, assim como do teatro do absurdo e da performance, Alfred Jarry oferece o material dramático de que precisamos para responder com violência poética à selvageria e à estupidez destes tempos. A montagem apresenta um olhar acurado e ácido sobre o contexto social e político brasileiro que, ao longo dos últimos anos, ganhou ares ubuescos bastante evidentes.
Historicamente, o humor sempre esteve em segundo plano em relação à tragédia. Ainda assim, é possível, rapidamente, pensar em alguns clássicos ocidentais que, mesmo sendo dramas, apostaram no caminho do riso. Ubu Rei é um desses clássicos. A obra de Jarry é, sobretudo, um texto atemporal.
Com uma trilha sonora que vai de Elis Regina a Raul Seixas, passando por cantigas para crianças e canções latinoamericanas de protesto, o Ubu Rei d’Os Geraldos e de Villela é uma sátira que, sobretudo, por meio da catarse do riso, pode nos ajudar a atravessar as estradas escuras nas quais nos embrenhamos no Brasil – que poderia ser a Polônia ou, melhor dizendo, lugar nenhum, como afirmou Jarry.
Que Gabriel Villela e essa trupe sigam juntos em novas aventuras por outras décadas. O Teatro merece! O resultado está nas imagens. Viva!
Bob Sousa é fotógrafo, mestre em Artes pela Unesp, crítico e jurado de Teatro da APCA (Associação Paulista de Críticos de Artes) e crítico e jurado de Artes Visuais do Prêmio Arcanjo de Cultura
Ficha Técnica
Direção, cenário e figurino: Gabriel Villela
Dramaturgia: Alfred Jarry
Produção: Os Geraldos
Tradução: Bárbara Duvivier e Gregório Duvivier
Adaptação dramatúrgica: Gabriel Villela e Os Geraldos
Assistente de direção: Ivan Andrade
Assistentes de figurino e adereços: Cristiana Cunha e Emme Toniolo
Costura: Ateliê de Dona Zilda Peres Villela
Iluminação: Ivan Andrade
Direção musical e preparação vocal: Babaya Morais e Everton Gennari
Visagismo: Claudinei Hidalgo
Maquiagem: Patrícia Barbosa
Fotografia: Stephanie Lauria e João TK
Design gráfico: Maria Vanêssa Cavalcanti
Assistentes de Produção: Bruna Paifer e Nicole Mesquita
Coordenação de produção: Tatiana Alves
Coordenação geral: Douglas Novais
Elenco: Carolina Delduque, Ciça de Carvalho, Douglas Novais, Everton Gennari, João Fernandes, Julia Cavalcanti, Gabriel Sobreiro, Gileade Batista, Paula Mathenhauer Guerreiro, Patrícia Palaçon, Railan Andrade, Roberta Postale, Valéria Aguiar e Vinicius Santino
Serviço
Ubu Rei
Com Os Geraldos e direção de Gabriel Villela
27/1 a 12/3, sexta a sábado, às 20h e domingos, às 18h.
Teatro Anchieta. R$ 12 a R$ 40.